Desde a
publicação do Acordo, tenho recebido de alguns amigos saudosistas – como o
Hélcio, a Simone, a Vera e a minha atual aluna Nádia de Assis – protestos pela
cassação do trema. Brincadeiras à parte, sugiro que pesemos os prós e os
contras, mas desde já afirmo que o posicionamento não é simples. A meu ver, o
fiel da balança tende para a extinção dessa notação léxica.
O
primeiro argumento dos que defendem a permanência do trema está relacionado com
a imperfeição da ortografia: linguiça e enguiça, frequente
e esquente são pronunciados de maneira diferente, embora sejam escritos
da mesma maneira. Isso acontece com certa frequência no português e com uma
frequencia bem maior em outras línguas. Veja-se, por exemplo, o caso da sílaba te. Em telefone
e dente, as pronúncias são completamente diferentes. No primeiro
caso, trata-se de uma consoante línguodental e, no segundo, de uma africada
palatal (para usarmos uma classificação simples e tradicional). Há ainda
inúmeros casos, que não percebemos direito, pelo fato de estarmos acostumados a
eles. Por que pronunciamos de maneiras tão diferentes palavras como próximo,
exame, xadrez e oxítona (respectivamente com sons de s, z, ch e
cs), todas escritas com x? E o que dizer de palavras como bênção e pertençam,
que se escrevem de maneira diferente, mas se pronunciam com um ditongo nasal na
última sílaba. Os exemplos são inúmeros e acho que não vale muito a pena
insistir nesse assunto.
O segundo
argumento diz respeito aos alfabetizandos. Segundo alguns professores, o trema
facilitaria a leitura de palavras como sequência, quinquenio, arguição e
equino (em que se pronuncia o u), como também de palavras em que
o u não é pronunciado: quina, aquiescência, quebranto e guirlanda.
O argumento faz sentido em parte. Aqueles que dão ou deram aula no curso
fundamental sabem como era difícil ensinar o uso do trema. Nos últimos anos ele
era raramente usado pelos alunos e também pelos adultos. Chegou mesmo a ser
dispensado nos vestibulares. Tratava-se de um caso inequívoco de morte
anunciada. O uso do trema podia até ajudar um pouco no princípio, mas logo se
tornava um peso morto.
Há ainda
aqueles que defendem o emprego do trema, por entender que, para o estrengeiro,
o seu uso facilita a pronúncia das palavras onde ele deveria ser usado. Aqui
também utilizo o argumento do parágrafo anterior. Pode até facilitar no início,
mas depois ele será rapidamente esquecido. Além disso – os professores de
português para estrangeiros que me perdoem – é preciso lembrar que a grafia da
nossa língua tem que ser boa para os usuários da língua portuguesa e não, para
os estrangeiros. Afinal, pondo de lado as questões políticas, por que houve
tantas reformas na ortografia da nossa língua? Por duas razões muito simples,
que, na verdade, se resumem em uma só. Para simplificar a escrita e por
questões pedagógicas. A meu ver, só isso justifica plenamente a sua
simplificação.