sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Perdi meu par de óculos (II)



            Se você quer ser bom em português, deve ter sempre em mente o seguinte: as regras das gramáticas tradicionais são válidas para a língua escrita culta. É claro que muitas dessas regras também são seguidas pela língua falada, mas é necessário ter em mente que há muitas normas da escrita padrão que não são usadas na fala, mesmo por pessoas cultas. Quer um bom exemplo? A gramática diz que, no sentido de existir, deve-se usar o verbo haver, não o verbo ter: em Belo Horizonte agora um novo hospital, houve uma grande enchente no Rio de Janeiro, havia muitas reclamações nesse setor, etc. Mas na língua falada, mesmo as pessoas cultas, com alto grau de escolaridade, usam o verbo ter no dia a dia: em Belo Horizonte agora tem um novo hospital, teve uma grande enchente no Rio de Janeiro,  tinha muitas reclamações nesse setor. Isso quer dizer que essas pessoas estejam erradas? Faz sentido dizer que advogados, médicos, juízes, desembargadores, professores, engenheiros, jornalistas e mesmo pessoas não formadas, mas conhecedoras do português, estejam cometendo erros de português? É claro que não. Essas pessoas estão corretíssimas. É preciso compreender que há uma certa distância entre a língua escrita culta – a tal da língua padrão, descrita pelas gramáticas – e a língua falada. Na língua falada usada por pessoas escolarizadas (e que também já foi descrita em gramáticas do português falado), ninguém diria “vai ali e busca o meu par de óculos” ou “hoje há feijoada”.

            Em resumo, (simplificando): língua escrita é língua escrita e língua falada é língua falada. Deus me livre de pessoas que falam “igualzinho como está na gramática”. Em geral são pessoas pedantes e cansativas. A propósito. Acabei de chamar o meu netinho e pedi a ele: “vai ali no meu quarto e traz o meu óculos, porque no jornal de hoje tem uma notícia interessante sobre o Neymar”. Pode?

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

"Perdi meu par de óculos!" (I)

            Você já ouviu alguém dizer “perdi meu par de óculos”? Mesmo pessoas cultas, estudadas, com curso superior, e até mesmo professores de português diriam: “esqueci meu óculos na farmácia”, “este óculos é muito pesado” ou “óculos escuro é mais barato e durável”.

            Mas se você abrir uma gramática ou um livro de consulta de português, você encontrará algo taxativo com relação ao assunto: palavras como óculos, calças e olheiras só são usadas no plural. Sendo assim, seria errado dizer: “meu óculos está quebrado”, “minha calça marrom está passada” e “minha olheira da direita está muito roxa”. O certo seria: “meus óculos estão quebrados”, “minhas calças marrons estão passadas” e “minhas olheiras da direita estão muito roxas”. Veja como a comunicação ficou comprometida, ao seguir as regras da gramática. Se eu quero me referir a apenas “uma olheira”, como fazer? Falar como manda a gramática ou romper com as regras estabelecidas. Se rompemos com as regras, não estaremos cometendo erros de português?



                                                                                                      (Continua)

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Maridas de aluguel (continuação)

            Não se você já notou, mas o gênero em português (masculino/feminino) tem umas coisas interessantes. Todas as palavras possuem um gênero definido, que é identificado pelo o ou pelo a que as antecede: o vidro, o pente, o revólver, o nível, o entrosamento, o budismo são palavras masculinas. A porta, a morte, a ponte, a ostentação, a idiossincrasia são palavras femininas. Apenas as palavras que designam seres animados apresentam-se aos pares, indicando o masculino e o feminino: esposo/esposa, professor/professora, mestre/mestra, maestro/maestrina, homem/mulher, cavaleiro/dama, patrão/patroa, jacaré macho/jacaré fêmea, o estudante/a estudante, etc. Mesmo assim, há palavras que designam seres animados, mas que são invariáveis: criança, testemunha, carrasco, etc. Mas essa é uma outra história.

            A língua já tem uma boa quantidade de pares consagrados pela tradição, como os que vimos no parágrafo anterior.

            Mas, como dissemos na última postagem, a lista dos pares consagrados pela gramática não é fechada, isto é, admite novas entradas, em consonância com os usos e costumes. É assim que hoje existem novos pares, como goleiro/goleira, ministro/ministra, desembargador/desembargadora e, por que não, presidente/presidenta. É verdade que o número de palavras invariáveis com e é maior, como estudante, gerente, paciente, servente, agente, imigrante, etc., mas existem também mestre/mestra e parente/parenta.

            Portanto, as duas formas para indicar o feminino (presidente/presidenta) estão corretas e vamos ver qual das duas vai ficar para a posteridade.

            Quanto à palavra marida, trata-se apenas de uma brincadeira inofensiva, perfeitamente aceitável no contexto em que foi usada. Passada a novela, as pessoas voltarão a empregar normalmente os pares marido/mulher, esposo/esposo, a não ser que a profissão da protagonista da novela se torne comum, ou, quem sabe, até mesmo regulamentada.  

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Maridas de aluguel




            A figura da marida de aluguel da novela das nove na Rede Globo suscita uma discussão interessante para os amantes do português. Marida é uma forma que não existe na língua – nem nos dicionários nem fora deles. O feminino de marido é mulher ou esposa. Mas é claro que o autor da novela quis estabelecer uma ponte entre marida de aluguel e marido de aluguel, sendo esta última expressão bastante conhecida da linguagem informal: designa o trabalhador que faz de tudo no lugar do consorte masculino que não existe ou que não é muito afeito a trabalhos um pouco mais pesados.

            Passemos para a questão que nos interessa.

            Muitas palavras se apresentam aos pares, para designar o macho e a fêmea: garoto/garota, mestre/mestra, galo/galinha, maestro/maestrina, bode/cabra. Às vezes a distinção é feita com o auxílio de outra palavra, como jacaré macho/jacaré fêmea ou o selvagem/a selvagem.

            Há pouco passamos por um problema interessante:  qual é forma correta: presidente Dilma Roussef ou presidenta Dilma Roussef? Em outras palavras: existe o par presidente/presidenta ou se deve conservar sempre a forma presidente?

            O gênero das palavras é a única categoria gramatical que se modifica com o sabor dos acontecimentos. Já o plural das palavras será sempre o mesmo, bem como a conjugação dos verbos.

            Tempos atrás, não havia a palavra goleira, simplesmente porque o futebol não era praticado por mulheres. Hoje, além de ser comuníssima na linguagem falada, essa forma está registrada no dicionário Houaiss. A mesma coisa se pode dizer com relação a palavras como ministra, desembargadora, capitã, soldada, marinheira, etc. São os costumes que autorizam a existência dessas palavras.

            Mas a gramática não deveria ser uma organização ou um sistema sólido, consistente, imutável? Ela permite essas “liberdades” de que estamos falando? Afinal, é lícito a Rede Globo usar a espressão “marida de aluguel”?



                                                                                                                (Continua)

terça-feira, 29 de novembro de 2011

A morte e a morte da gramática na escola

            O artigo que transcrevo abaixo foi publicado no jornal Estado de Minas - caderno Pensar - no dia 19 de novembro do corrente ano. 




            Parafraseando Jorge Amado, diríamos que a gramática já morreu – ou está moribunda – nas escolas brasileiras. Falta agora enterrá-la. Vejamos o porquê desse pensamento gramaticida.

            O Brasil ocupa o 84º lugar no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) das Nações Unidas, bem abaixo de vizinhos como o Chile (44º) e a Argentina (45º). Dos indicadores usados no cálculo do IDH – renda per capita, saúde e educação – este último pode ser considerado a vergonha nacional. A escolaridade média do brasileiro é de 7,2 anos, a mesma do Zimbábue, que aparece no 173º lugar no ranking da ONU. Não nos detenhamos, porém, nos números frios das estatísticas. Todos sabemos das péssimas condições do ensino público em nosso país: a degradação física das escolas, a falta ou a qualidade ruim do material escolar,  a ausência de transporte adequado para os alunos, a invasão das escolas por parte de ladrões e baderneiros, a violência generalizada, inclusive contra os professores, a apatia ou mesmo a descrença dos professores e pedagogos com relação a um ensino verdadeiramente eficaz, a baixa remuneração dos docentes, etc., etc.

            Como se isso não bastasse, há um outro fator intrínseco às disciplinas escolares que tem contribuído decisivamente para a má qualidade do ensino brasileiro. Referimo-nos aos conteúdos que são ministrados nas escolas. No caso específico do Português, causa espanto como esse monstro jurássico chamado gramática ainda frequenta os bancos escolares. Uma pesquisa recente revelou que os estudantes, principalmente do ensino médio, abandonam os estudos por dois motivos principais: necessidade de ajudar os pais e falta de interesse pelo que é ensinado na escola. “É uma chatice sem fim”, chegou a declarar um aluno. O fato de uma oração ser substantiva completiva nominal ou substantiva objetiva indireta, ou de um substantivo ser concreto ou abstrato, ou ainda de um pronome ser indefinido ou interrogativo, não vai influenciar em nada no desempenho linguístico do aluno e não tem nada a ver com o mundo em que vivemos. O objetivo do ensino de Português é levar o aluno a ler e a escrever adequada e corretamente. A apropriação desses conteúdos na escola – ou, pior ainda, a “decoreba” dos dogmas gramaticais – só contribui para aquilo que está se tornando comum entre os estudantes do ensino básico: a aversão ao estudo da Língua Portuguesa, justamente essa disciplina que tem tudo para ser considerada a mais amada da escola.

            Nos últimos anos temos defendido, por meio de cursos, palestras, artigos e livros, o bordão “gramática: nunca mais”. Para não haver mal-entendidos, vamos esclarecer algumas questões:

            1 – A nossa luta, ou melhor, a nossa cruzada é contra o ensino da gramática no ensino básico (fundamental e médio). É claro que a gramática sempre existiu e sempre existirá, mas só deve ser estudada nos cursos superiores de Letras, por especialistas em estudos da linguagem, futuros professores de Português.

            2 – Com “gramática: nunca mais” não estamos querendo dizer que se possa escrever ou falar de qualquer jeito, como já insinuaram alguns críticos mal-informados. Defendemos a postura de que é necessário aprender a língua padrão e de que é perfeitamente possível dominá-la sem necessidade de aprender gramática. Há vários argumentos para sustentar essa hipótese: a) alunos e pessoas em geral não sabem nada de gramática, mas muitos sabem escrever razoavelmente bem e, às vezes, muito bem; b) profissionais da escrita, como escritores e jornalistas, por exemplo, afirmam claramente que não entendem nada de gramática (embora escrevam muito bem); c) o Enem e a UFMG (além de outras universidades) não exigem conhecimento de teoria gramatical em suas avaliações.

            Os defensores do ensino de Português sem gramática apresentam vários argumentos e algumas pesquisas para comprovar esse ponto de vista, mas não podemos aqui enumerá-los todos. São linguistas como Marcos Bagno, Sírio Possenti, Luiz Persival Leme Britto, Carlos Franchi, Mike Dillinger, dentre outros. Eles se baseiam principalmente no fato de que, para o cidadão comum, a gramática não tem qualquer proveito. Há porém muitas forças que defendem o lado contrário: a atitude eremítica de alguns linguistas teóricos; o imobilismo gangrenoso dos currículos escolares, que vem repetindo a si mesmo há décadas ou mesmo há séculos; o dolce far niente das editoras e dos gramáticos, que não querem abrir mão da galinha dos ovos de ouro; a atitude patrulhesca do MEC, que, por meio da NGB, dos Parâmetros Curriculares e do PNLD, inviabiliza qualquer tentativa de aerificação da disciplina e, por fim, a postura simplória de alguns professores, que indagam inocentemente:  “O que vou ensinar na aula de Português, se eu não puder dar gramática?”

            Modernos estudos linguísticos têm insistido bastante no papel fundamental do texto no ensino da Língua Portuguesa. Texto, texto, texto... é o que interessa. Textos em profusão. Leitura, compreensão, interpretação, interação com o social, paráfrases, paródias, resumos, sinopses, etc. Mas será isso é suficiente? Como questionam alguns autores, basta expor os alunos aos textos? Para levar o aluno ao domínio da língua padrão, basta ler e escrever textos?

            A nossa experiência como professor de Português no ensino básico e superior nos permite afirmar que não. Não basta expor os alunos aos textos. Eles precisam dominar a ortografia, a pontuação, a concordância verbal, a regência, a colocação de pronomes, a conjugação verbal, etc. Mas como? Não haveria contradição entre o que acabamos de expor e o que foi dito nos parágrafos anteriores? Não. Em vez de estudar esses itens gramaticais, eles precisam usá-los, praticá-los, de maneira intensiva e mesmo repetitiva. Tudo isso deve e pode ser feito, é lógico, sem a parafernália da definição, da classificação e do emprego da nomenclatura especializada. É essa, em síntese, a proposta do livro que acabamos de lançar: o domínio da língua padrão, por meio de exercícios específicos, sem necessidade de estudo gramatical.

            Uma comparação pode ilustrar bem o que estamos querendo dizer. Um pai pode gastar horas e horas ensinando ao filho os fundamentos teóricos de como andar de bicicleta: os nomes das peças, os tipos de guidom, a classificação dos esquadros, as especificações dos aros, etc. Nada disso o fará andar de bicicleta. É o uso, a prática, o emprego, que operará a transformação. 

            Alguns professores de Português explicam assim o emprego do verbo assistir (atente-se para a parafernália terminológica): trata-se de um caso de regência verbal; no sentido de estar presente (o público assistiu ao show), o verbo é transitivo indireto, ou seja, exige um complemento verbal com preposição (sabe-se lá quais são as preposições em português?); o complemento do verbo deverá vir regido pela preposição a e receberá a classificação de objeto indireto.

            Não seria mais fácil, simples e lógico levar o aluno a construir frases com o verbo assistir acompanhado da partícula a?

            Gostaríamos muito de saber a sua opinião sobre o assunto. Entre em contato conosco por meio do blog www.luizrochinha.blogspot.com.



 

                                

Luiz Carlos de Assis Rocha – Professor de Língua Portuguesa da Faculdade de Letras da UFMG. Doutor em Língua Portuguesa pela UFRJ. Autor de Estruturas Morfológicas do Português (Martins Fontes), Gramática:nunca mais (Martins Fontes) e Gramática nunca mais 2 (Comunicação de Fato).

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Resposta ao teste de acentuação gráfica

Resposta ao desafio sobre acentuação gráfica:



Acentue as palavras abaixo, se necessário:



1) açúcar-ágeis-bisavô-algum-ninguém       

2) tênue-contribuinte-contribuído-éter-alfinete                             

3) concluiu-Piauí-hífens-(o) revólver-funil             

4) parabéns-coronéis-assembleia-reu-caracóis       

5) urubu-baú-Carandaí-caqui-balaústre      

6) desperdício-núpcias-incrível-linguista-linguística   

7) íris-álbuns-(eles) intervêm-(eles) constroem-(ele) mantém   

8) xerox-tórax-oásis-fórceps-traí-lo              

9) rainha-(o) apoio-(eu) apoio-gratuito-ruído               

10) juiz-juízes-juíza-ajuizado-juizado           

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Acentuação gráfica I - Desafio

A partir de hoje, vou colocar no meu blog alguns desafios para você tentar resolver. Escreva-me, se houver alguma dificuldade de sua parte para responder. Mais no fim da semana vou dar a resposta e comentar alguma coisa que vocês me enviarem. Estes desafios estão no meu livro Gramática nunca mais 2.

DESAFIO



Þ Acentue, se necessário, as seguintes palavras:

(Tem direito a 1 ponto quem acertar todas as palavras da mesma linha. O exercício vale 10 pontos)



1) açucar          ageis                bisavo                 algum                  ninguem          (     )

2) tenue            contribuinte     contribuido         eter                      alfinete            (     )                    

3) concluiu       Piaui                hifens                 (o) revolver          funil                (     )

4) parabens       coroneis          assembleia          reu                        caracois          (     )

5) urubu            bau                  Carandai             caqui                    balaustre         (     )

6) desperdicio   nupcias            incrivel               linguista               linguistica      (     )

7) iris                albuns              (eles) intervem   (eles) constroem  (ele) mantem   (     )

8) xerox            torax                oasis                   forceps                 trai-lo              (     )

9) rainha           (o) apoio          (eu) apoio           gratuito                ruido               (     )

10) juiz              juizes              juiza                    ajuizado               juizado            (     )



                                                                                                             TOTAL:     _____ pontos

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Lançamento do GRAMÁTICA NUNCA MAIS 2

Amanhã, dia 17/11, quinta-feira, a partir das 19:30 h, haverá o lançamento do meu novo livro Gramática nunca mais 2. Será na Livraria Mineiriana, na Rua Paraíba, 1419, Savassi. Gostaria muito de contar com a sua presença.
Uma pequena explicação: em 2002, publiquei a primeira edição do Gramática: nunca mais, pela Editora UFMG. Em 2007, houve a segunda edição, pela Editora Martins Fontes. Esse primeiro livro é direcionado especialmente aos professores de Português e contém algumas reflexões e teorias sobre o ensino do nosso idioma.
Estou publicando agora o Gramática nunca mais 2, pela Editora Comunicação de Fato. Trata-se de um livro só de exercícios. Nele eu tento provar que é perfeitamente possível ensinar ou aprender o português padrão sem necessidade de saber gramática. É um livro mais voltado para o público em geral. A introdução da obra retoma alguns aspectos do primeiro livro e mostra que não há necessidade de ler o nº 1 para entender o Gramática nunca mais 2.
Um abraço e até lá.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

O ministro poderá ser abatido de qualquer maneira

           Há controvérsias com relação ao emprego do acento indicador da crase na frase “o ministro foi abatido à bala” (ou a bala).

Uma maneira prática de sabermos se um determinado a leva o acento grave (`) ou não, é a seguinte: substituímos a palavra que se segue ao a por uma palavra masculina. Se o a se transformar em ao, devemos colocar o acento. Caso contrário, fica sem acento. Exemplos:                   

            Fábio foi à praia. (ao cinema)

            Obedeço às leis de Deus. (aos mandamentos)

                        A praça fica a duas quadras de casa. (a dois quarteirões)

            No caso do Ministro, vamos tentar a substituição:

                        O Ministro falou que só sai abatido a bala. (a porrete)

            Conclusão: segundo o critério apresentado, a bala não deve levar acento indicador da crase. Está certa a solução? Sim, está certíssima.

            Há, porém, uma outra posição com relação ao assunto.

            Segundo alguns autores, todas as expressões que indicam tempo, lugar, modo, meio, intrumento, etc. bem como as expressões feitas, isto é, consagradas pelo uso, devem receber o acento indicador da crase: às claras, às ocultas, às escondidas, às vezes, às pressas, à noite, à vista, à direita, à vontade, à máquina, à chave, à gasolina, à procura de, à custa de, à proporção que, à medida que e, enfim, À BALA. (Lembre-se: só se usa o acento grave diante de palavras femininas).

            A segunda posição é, a nosso ver, a mais indicada, por dois motivos:

            1º) Algumas vezes não dá para substituir a palavra masculinas pela feminina: ele agiu às claras (ele agiu.......?)

            2º) Com o acento indicador da crase, a frase pode ficar mais clara. Exemplos:

            A noite costuma ficar mais agradável ou à noite costuma ficar mais agradável.

            A sombra da bananeira costumava abrigar um grande número de pessoas ou à sombra da bananeira costumava abrigar um grande número de pessoas.

            A máquina escreve com bastante rapidez ou à máquina escreve com bastante rapidez.

            Como nos preocupamos bastante com a questão do ensino de Português, a segunda solução nos parece a mais acertada, sob o ponto de vista didático.

            Conclusão: o Ministro que tome cuidado, porque ele pode ser demitido tanto a bala quanto à bala. Mas as duas formas estão corretíssimas.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

O ministro só sai abatido à bala ou a bala?

              Na edição do último dia 9, o Estado de Minas transcreveu uma fala do Ministro do Trabalho, Carlos Lupi, que terminava assim: “Só abatido à bala”. Subentende-se: o Ministro só deixaria o governo se fosse abatido à bala. A transcrição é o título de uma reportagem e aparece em letras garrafais. Como você pode notar, foi colocado o acento indicador da crase sobre o a.

            No dia seguinte, na charge de Son Salvador, na página 6, o personagem aproxima-se da Presidente Dilma Roussef e afirma: “O Lupi disse que só sai abatido a bala.”

            A novela continuou, porém, no dia de hoje (11/11/11). Na primeira página do jornal saiu:  "Depois de dizer que dó deixaria o cargo abatido a bala, ministro do Trabalho, Carlos Lupi, pede desculpas públicas e declara amor à presidente.”

            Afinal, deve-se escrever a bala ou à bala?

            Antes de dar a resposta eu gostaria de ouvir a sua opinião. Escreva-me.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

"Soletrando" esfoliação (ou exfoliação?)

                                         “Soletrando” esfoliação (ou exfoliação)



            É interessante notar que questões relacionadas com a língua portuguesa, quando trazidas a público, costumam causar polêmica na mídia. Recentemente aconteceu o caso do livro didático aprovado pelo MEC. A meu ver, houve um tremendo de um mal-entendido na questão, mas não vale a pena voltar ao assunto no momento.

            Surgiu agora o caso do “soletrando”, do programa do Luciano Huck. Foi pedido à aluna Paola Maria de Souza, de Conselheiro Lafaiete,  que soletrasse a palavra “esfoliação” (ups! ou “exfoliação”?). A aluna soletrou a palavra com s, mas a banca disse que é com x. A aluna retrucou, as dúvidas apareceram, os especialistas opinaram e até a Academia Brasileira de Letras opinou, ou melhor, sentenciou: existem as duas formas. De fato o Aurélio e o Houaiss são claríssimos: exfoliar é o mesmo que esfoliar. Logo, exfoliação, o ato de exfoliar, é o mesmo que esfoliação, o ato de esfoliar. O bom-senso da Rede Globo prometeu rever a questão.

            Não adianta jogar mais lenha na fogueira, mas a pergunta que fica é: isso é comum no português? Por que isso se deu com a palavra esfoliação?

            São muito raras as palavras que se escrevem de modo diferente, mas que são pronunciadas da mesma maneira. Aqui não valem casos como louro e loiro, bêbado e bêbedo, efeminado e afeminado. Neste caso estamos diante de variantes, ou seja, variações de uma mesma palavra, com uma ligeira modificação na pronúncia. Casos como o de esfoliação, como eu dizia, são raros. Só me lembro no momento de cãibra e câimbra, ambas as formas abonadas pelo VOLP. É claro que não estou me referindo a formas esdrúxulas, garimpadas nos dicionário e que não fazem parte da língua viva. Você se lembra de algum caso interessante?

            Mas, afinal, por que existem as formas exfoliar e esfoliar?

            Ex- e es- são formas do mesmo prefixo português, que tem o sentido de movimento para fora. As palavras com ex- são mais clássicas, mais tradicionais, ou porque vieram diretamente do latim, ou porque foram reconstituídas. É o caso de: expectorar, exceder, expulsar, excelente, expedir, etc. Já as palavras com es- sofreram uma evolução normal na história da língua e passaram a ser escritas com s: esfolhar, esgotar, esvoaçar, escoucear, etc. Provavelmente, esfoliar sofreu a evolução normal da língua e exfoliar é uma forma erudita, que talvez tenha sido reconstituída na época de Camões.  

           

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

polêmica no soletrando

http://www.otempo.com.br/noticias/ultimas/?IdNoticia=186766,OTE&busca=soletrando&pagina=1

A gramática não é condição para escrever bem. Saiba algumas razões:

     
 A primeira gramática grega só surgiu no século II antes de Cristo, com Dionísio da Trácia. A língua grega viveu, portanto, vários séculos sem uma gramática explícita, mesmo no período áureo de sua literatura e de sua filosofia.


 O contato constante com modelos linguísticos diferentes, como a televisão, a internet e a língua escrita, entre outros, leva o aluno a se libertar de seu acanhado linguajar e a se familiarizar com novos padrões linguísticos.

  
 Todo falante possui uma gramática internalizada, que ele domina e utiliza, sem necessidade de conhecimento de teoria gramatical. A explicitação dessa gramática é tarefa dos linguistas.
 

 Todo aluno que ingressa no curso fundamental fala português, ou seja, entende a língua materna e se expressa por meio dela, de maneira intuitiva; a tarefa da escola consiste, basicamente, em adaptar esse português de casa à língua culta.
 

 A gramática tradicional, que é ensinada na escola, ficou estagnada no tempo (talvez no mundo grego) e não acompanhou o progresso científico. Por isso mesmo é considerada pelos linguistas como retrógrada, contraditória e ultrapassada.


 O cidadão comum, com raras exceções, não se interessa pelo estudo de teorias linguísticas (como a que está nas gramáticas, por exemplo); interessa a ele, pura e simplesmente, saber usar a língua adequadamente, de acordo com o que as circunstâncias exigem.


 O estudo da gramática não contribui para um conhecimento efetivo da língua. Pelo contrário, a sua presença nos bancos escolares é profundamente perturbadora para o seu aprendizado, devido ao caráter criptográfico de sua teoria, que acaba infligindo medo e repulsa nos alunos.


 Que prazer ou interesse (ou utilidade) há em estabelecer a distinção entre uma oração subordinada substantiva completiva nominal e uma oração subordinada substantiva objetiva indireta?


quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Lançamento de Gramática nunca mais 2 - exercícios

            Na próxima sexta-feira será lançado o meu livro Gramática nunca mais 2 – exercícios. O lançamento será na Faculdade de Letras da UFMG (Pampulha), na sala 2002, às 19:30 h. Haverá uma palestra e depois o lançamento. Em 2002 publiquei o Gramática: nunca mais – o ensino da língua padrão sem o estudo da gramática. 

            Você deve estar perguntando: por que o nº 2? Não basta o nº 1?

            Há uma diferença entre os dois. O primeiro é dedicado especialmente aos professores de português, aos alunos das faculdades de Letras e às pessoas que se interessam de um modo especial pelo ensino da língua. É um livro mais teórico, com algumas lições práticas como demonstração.

            O segundo livro é constituído somente de exercícios. Há uma introdução em que eu faço o resumo da ópera, mas o objetivo do trabalho é demonstrar que é perfeitamente possível ensinar o português padrão sem o auxílio da gramática. Nos dois livros eu defendo a ideia de que o aluno precisa aprender conjugação verbal, emprego de pronome, concordância verbal, uso das conjunções e das preposições, etc., sem necessidade de saber gramática. Lembro a todos que gramática pressupõe: definição, classificação e emprego de terminologia técnica. As pessoas precisam saber usar, por exemplo, o verbo intervir em todo tipo de frase (ele interviu ou interveio? se ele intervisse ou interviesse?), mas não há necessidade de saber se é verbo regular, irregular, anômado, defectivo, abundante, impessoal, pretérito mais-que-perfeito, pretérito imperfeito do subjuntivo, etc. O importante é saber usar o verbo e não decorar essa parafernália terminológica. É perfeitamente possível alcançar esse objetivo por meio de exercícios específicos, como se poderá ver em Gramática nunca mais 2.