sexta-feira, 22 de junho de 2012

Linguistas e professores de português


            No último dia 15 chamou a minha atenção uma Carta do leitor publicada no Estado de Minas, intitulada “Leitor critica postura de linguistas”, de autoria de  Manoel Eulálio d’Assumpção.

            O autor da carta afirma: “Deslumbrados linguistas ou sociolinguistas que não sabem a língua portuguesa (por terem a cabeça atulhada de teorias fantasiosas e por desprezar irresponsavelmente o conhecimento das normas básicas da linguagem) viraram uma praga no ensino de nosso idioma.”

            Não é a primeira vez que aparece esse tipo de problema na imprensa – o choque de posturas entre as teorias linguísticas e o ensino da língua portuguesa. Não adianta tapar o sol com a peneira: as divergências existem, vêm de muitos anos, mas é possível traçar uma linha clara de atuação entre os linguistas e os professores de português.

            A linguística é o estudo científico da linguagem humana. A sua preocupação básica é a língua natural, ou seja, aquela que é falada espontaneamente pelos grupos sociais. É por isso que a linguística se preocupa em estudar toda e qualquer manifestação da linguagem humana, como o linguajar dos barranqueiros do rio São Francisco, dos boiadeiros do interior do Mato Grosso, dos flanelinhas de Belo Horizonte, dos plantadores de cana de açúcar do Nordeste, dos frequentadores dos bailes funk da periferia do Rio de Janeiro, etc. A “linguagem” é estudada em sua essência, tal como ela se apresenta, livre de policiamentos, censuras ou julgamentos de valor, do mesmo modo como se estuda um       fenômeno antropológico ou sociológico. A gramática normativa não tem nada a ver com a descrição das línguas ou dos linguajares e a grande maioria dos estudos linguísticos se baseia na linguagem oral. É o que se lê no Dicionário de Linguística de Dubois et al.: “Todos os fatos de língua são estudados: o ponto de vista normativo é excluído”.

            A língua padrão escrita, que é apresentada nas gramáticas tradicionais, não é (ou não deveria ser) objeto de estudo da linguística. Essa é uma modalidade de linguagem tradicional, artificial, convencional, que tem suas próprias regras, diferentes, na superfície, das regras da linguagem falada. Mas é necessário dizer que a gramática tradicional, apesar de apresentar inúmeras contradições, omissões e equívocos em sua teoria, apresenta um modelo de linguagem que é seguido pela imensa maioria das publicações em que se espera que seja usada a língua padrão, como nos jornais, revistas, periódicos, livros (e artigos) técnicos e científicos, linguagem oficial, burocrática, comercial, etc.

            Essa língua padrão é o principal objeto de estudo do ensino fundamental. Como diz Possenti, “o objetivo da escola é ensinar a língua padrão. Qualquer outra hipótese é um equívoco político e pedagógico”. É com esse tipo de linguagem que devem se preocupar os professores de português, tanto do ensino básico quanto do ensino superior. Afinal, a língua padrão vai ser importante, essencial e muitas vezes indispensável na vida das pessoas.

            Mas isso é assunto para a próxima postagem.

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